Imortalização de células progenitoras sanguíneas permitem gerar glóbulos vermelhos em larga escala em laboratório

Imortalização de células progenitoras sanguíneas permitem gerar glóbulos vermelhos em larga escala em laboratório

As células progenitoras sanguíneas “imortais” poderiam se tornar uma fonte alternativa para transfusões de sangue

O suprimento de bolsas para transfusões de sangue é um problema constante em hemocentros do mundo todo. Todos os dias, milhares de pessoas necessitam de uma transfusão de sangue, seja por conta de uma cirurgia ou um acidente em que houve perda de grandes volumes de sangue, seja por conta de doenças que afetam os componentes do sangue, como as plaquetas, glóbulos brancos ou glóbulos vermelhos, e o número de doações nem sempre atende a esta demanda.

Mas uma pesquisa divulgada em Março na revista Nature Communications traz uma nova esperança para todos aqueles que dependem de transfusões de sangue. Pesquisadores da Universidade de Bristol, na Inglaterra, conseguiram gerar em laboratório linhagens de células progenitoras sanguíneas “imortais”, ou seja, que mantêm a sua capacidade proliferativa de forma indefinida. Dessa forma, estas células podem constantemente produzir mais e mais células progenitoras que podem então se diferenciar em células especializadas do sangue. No caso dessa pesquisa, os cientistas conseguiram realizar isto para células progenitoras de glóbulos vermelhos.

Várias tentativas nesse sentido haviam sido realizadas no passado, mas não tiveram sucesso. Tentou-se estabelecer estas linhagens, por exemplo, a partir de células progenitoras presentes no sangue periférico ou no cordão umbilical, simplesmente através de métodos de cultivo especiais. Porém, as células mantinham a capacidade proliferativa apenas por pouco tempo e, assim, não representam métodos viáveis para a produção das grandes quantidades de células necessárias para transfusões. Outros grupos têm tentado produzir estas células progenitoras a partir de células-tronco pluripotentes induzidas, mas nenhum protocolo ainda se mostrou eficiente.

O que os cientistas de Bristol fizeram foi utilizar uma metodologia que já é usada na ciência há bastante tempo para “imortalizar” células: eles manipularam o funcionamento de alguns genes que controlam o envelhecimento celular. Uma das consequências do envelhecimento celular é a perda da capacidade proliferativa e, portanto, impedindo o envelhecimento, as células permanecem se dividindo e gerando mais células. Pode parecer curioso, mas isso é realizado através da inserção de genes virais nas células, que desligam genes humanos que favorecem o envelhecimento celular e ativam outros que são importantes para manter as células “jovens”.

Em seguida, eles demonstraram que estas células progenitoras podiam ser diferenciadas de forma eficiente em glóbulos vermelhos e, através de uma série de estudos comparativos, comprovaram que estes glóbulos vermelhos gerados em laboratório não têm diferenças em termos moleculares e funcionais com relação aos produzidos pelo organismo.

Um outro aspecto bastante interessante dessa metodologia é que, como as células produzidas são jovens, pacientes que se beneficiassem de transfusões de sangue com estas células poderiam espaçar mais os procedimentos, pois elas teriam um tempo de sobrevivência maior no organismo, ao contrário de células obtidas de doações. Além disso, desde que o indivíduo utilizado como fonte inicial dessas células progenitoras tenha sido extensivamente investigado com relação a doenças que podem ser transmitidas através do sangue, esta metodologia representa uma forma mais segura de se evitar a contaminação dos beneficiários da doação.

A única ressalva é que este processo ainda é muito caro para efetivamente poder ser utilizado na prática clínica e em larga escala. No entanto, é possível que, com mais estudos e o refinamento da metodologia, o processo seja barateado ao longo do tempo, tornando-se assim uma alternativa viável para transfusões, especialmente para indivíduos com grupos sanguíneos raros ou em áreas do mundo onde os estoques de bolsas são insuficientes.

Referências:

An immortalized adult human erythroid line facilitates sustainable and scalable generation of functional red cells.

Trakarnsanga K, Griffiths RE, Wilson MC1, Blair A, Satchwell TJ, Meinders M, Cogan N, Kupzig S, Kurita R, Nakamura Y, Toye AM, Anstee DJ, Frayne J.

Nat Commun. 2017 Mar 14;8:14750. doi: 10.1038/ncomms14750.


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