Os cientistas combinaram células-tronco humanas e partes do intestino de ratos para criar enxertos de intestino. Essa técnica pode ajudar pacientes com problemas gastrointestinais no futuro.
O intestino é um órgão muito importante para a absorção de nutrientes, e é lá que ocorre a maior parte da digestão dos alimentos. Por isso, as consequências de certos distúrbios gastrointestinais – como a doença de Crohn, câncer e infarto no intestino – podem ser bem complicadas em alguns casos, levando a uma condição conhecida como síndrome do intestino curto. Quando uma pessoa tem essa síndrome, o intestino dela não é mais capaz de absorver nutrientes adequadamente, e é necessária uma nutrição intravenosa para sobrevivência.
Outra saída nesses casos é o transplante de intestino. Já é possível fazer isso, mas, além da disponibilidade limitada de órgãos para doação, as taxas de sucesso dos transplantes são relativamente baixas. As principais complicações são relacionadas à resposta imune do organismo, que pode resultar em rejeição aguda, ou no uso de imunossupressores, que levam a uma maior chance de problemas como infecções e disfunção renal, por exemplo (nós já falamos um pouco no blog sobre como o sistema imune age nessas situações aqui).
É aí que as células-tronco podem fazer toda a diferença. Usar células do próprio paciente é uma estratégia que tem o potencial de eliminar o problema das listas de espera para transplantes, como a possibilidade de rejeição do órgão pelo organismo e a necessidade do uso de imunossupressores – uma vez que o órgão produto dessa bioengenharia será compatível com o paciente. É nesse sentido que o estudo publicado recentemente na revista Nature Communications é importante: os pesquisadores demonstraram que é possível, sim, usar células humanas para desenvolver intestinos funcionais em laboratório.
Eles usaram células-tronco pluripotentes induzidas humanas (ou iPSCs, você pode ler um pouco sobre essas células aqui) para criar células progenitoras epiteliais intestinais e essas células foram, então, usadas para repovoar um arcabouço obtido a partir de intestinos dos ratos utilizados no experimento (para fazer esse arcabouço, eles primeiro lavaram os intestinos com um detergente que eliminou as células presentes no tecido, preservando apenas a estrutura). Eles conseguiram, também, manter a vascularização do órgão, e usaram células humanas endoteliais para repovoar essa rede vascular. Pesquisas anteriores já tinham conseguido criar organoides de intestinos com células-tronco, mas não com o nível de complexidade funcional desse estudo.
Os enxertos de intestino foram analisados tanto ex vivo (fora do organismo) como transplantados em ratos. O período de análise foi de 28 dias – e os enxertos sobreviveram por todo esse período. O grupo encontrou evidências de que as funções de regulação da absorção da glicose e de gorduras estavam sendo em algum grau desempenhadas pelas células presentes na estrutura. O resultado é relevante para a pesquisa, mas ainda é necessário melhorar essa função em estudos posteriores para que a técnica desenvolvida por eles possa ser usada em aplicações clínicas. Além disso, é preciso testar o uso em animais maiores e por períodos mais longos.
Referência:
Bioengineering of functional human induced pluripotent stem cell-derived intestinal grafts. Kitano K et al. Nature Communications. 2017.