As pesquisas para o desenvolvimento de curativos estão cada vez mais focadas na obtenção de materiais que participem ativamente do processo de regeneração da pele lesionada. O uso de células-tronco em curativos tem se mostrado promissor para acelerar esse processo de regeneração, formando um tecido saudável, além de diminuir a formação de cicatrizes.
A pele é considerada o maior órgão do corpo humano: um adulto é recoberto por cerca de 2 metros quadrados de pele, com uma média total de 3,5 quilos. Além de servir como barreira de proteção contra ataques microbianos, químicos ou mecânicos (impactos), este órgão também é responsável por funções vitais, como manutenção da hidratação, da temperatura e do metabolismo corporais. Quando a pele é machucada, devido a acidentes, como cortes ou queimaduras, ou a doenças, suas funções ficam comprometidas e é fundamental que se garanta uma cicatrização adequada da área afetada, a fim de que não haja danos à saúde do indivíduo.
Particularmente queimaduras de terceiro grau ou ferimentos crônicos demoram muito mais para cicatrizar e cuidados intensivos são necessários, fazendo com que o tratamento seja mais caro. Nesses casos, o uso de enxerto de pele autólogo (pele do próprio paciente) é o tipo de tratamento mais utilizado. Mesmo tomando todos os cuidados necessários durante esse procedimento, alguns problemas podem acontecer, incluindo a incompatibilidade de textura e cor da pele da região doadora com a da região receptora do enxerto, a formação de cicatrizes, além de baixa disponibilidade de regiões de pele saudáveis para doação em pacientes com lesões que já afetaram grande parte de seus corpos.
O uso de substitutos de pele artificiais é uma alternativa para resolver estes problemas. Estes substitutos podem ser materiais de origem não biológica, ou seja, não provenientes de doadores humanos ou animais, e geralmente feitos a partir de polímeros. Os polímeros são moléculas com cadeias ou redes bem longas, constituídas de unidades estruturais menores, chamadas monômeros. Eles podem ser de origem natural, ou seja, presentes na natureza (tais como colágeno e gelatina, entre outros) ou de origem sintética, isto é, obtidos a partir de reações químicas. Estes materiais, chamados de substitutos de pele artificiais de primeira geração, funcionam como curativos, sendo capazes de melhorar e acelerar a cura de lesões.
A nova geração de substitutos de pele artificiais engloba a utilização desses materiais em combinação com diversos tipos de células, sendo células-tronco as de maior destaque. Para que seja eficiente, o material deve contar com uma fonte celular abundante e acessível, idealmente obtida a partir dos tecidos do próprio paciente, a fim de minimizar preocupações relacionadas à rejeição e à transmissão de doenças.
Com a utilização dessa nova geração de substitutos de pele, é possível não só criar um ambiente adequado para a cicatrização, mas também auxiliar a regeneração do tecido danificado. As células-tronco atuam, por exemplo, no processo de vascularização (formação de uma nova rede de vasos sanguíneos) o que é muito importante para a obtenção de um tecido saudável. Nesse caso, a pele regenerada é capaz de desempenhar suas funções normalmente, além de ter um aspecto satisfatório do ponto de vista estético, o que é muito importante para o paciente.
Como um exemplo prático de pesquisa voltada para a obtenção desse tipo de substituto de pele, selecionamos um trabalho recente divulgado na revista científica Scientific Reports, publicada pela Nature Research. Neste trabalho, um grupo de pesquisadores da Universidade de Calgary, no Canadá, desenvolveu um biomaterial constituído de polímeros, de origem natural (gelatina) e sintética (policaprolactona), ao qual foram adicionadas células-tronco multipotentes, mais especificamente células precursoras derivadas da pele. A vantagem do uso dessas células é sua facilidade de propagação a partir de uma simples biópsia de pele minimamente invasiva e sua capacidade de se diferenciar em diversos tipos de célula presentes na pele. Os pesquisadores fizeram testes in vitro, para estudar o comportamento das células no material, e também in vivo, para avaliar a resposta observada após sua utilização no tratamento de ferimentos de pele de ratos durante o período de três semanas. Os resultados obtidos foram excelentes: a estrutura do tecido regenerado se mostrou muito semelhante à de um tecido normal e saudável que não foi lesionado. Além disso, os testes indicaram redução na formação de cicatrizes, favorecendo a componente estética do tratamento. O grupo de pesquisadores concluiu que os materiais por eles estudados são adequados para uso em conjunto com as células-tronco, sendo considerados promissores na aplicação de tratamento de lesões profundas, promovendo a regeneração da pele.
Para que produtos como este sejam de fato disponibilizados para tratar pacientes de queimaduras e lesões de pele graves, é necessário que se utilize boas práticas de fabricação para sua obtenção, com a finalidade de atingir um padrão de qualidade. É preciso assegurar a manutenção da viabilidade celular após o processamento das células-tronco em conjunto com o material, bem como garantir a biocompatibilidade do produto com outras células e tecidos na região de seu implante. Tendo em vista a evolução da bioengenharia e o fato de que os substitutos de pele tem sido fontes constantes de pesquisa e aprimoramento, podemos dizer que os pacientes poderão se beneficiar desta nova geração de produtos para regeneração de pele em breve.
Referências: