O estudo, que utilizou células-tronco neurais humanas de origem embrionária para tratar lesão espinhal em macacos rhesus, é importante para estabelecer parâmetros terapêuticos em primatas que devem guiar a aplicação clínica.
O uso de células-tronco para tratar lesão espinhal é um dos temas mais recorrentes aqui no blog, e não é para menos: essa é uma das áreas terapêuticas em que os avanços da pesquisa em medicina regenerativa têm o potencial de mudar o prognóstico dos pacientes de maneira muito significativa. Só no último ano, destacamos resultados positivos em roedores tratados com células-tronco humanas da mucosa oral que tiveram melhoras na lesão espinhal, na mobilidade e na percepção sensorial, e também em cães, que tiveram melhoras significativas na capacidade locomotora após a injeção de células-tronco mesenquimais do tecido adiposo no local da lesão.
A maior parte dos estudos pré-clínicos nessa área são feitos com roedores e o trabalho que destacamos hoje, publicado na revista Nature Medicine, mostra como pode ser importante estudar um modelo mais parecido com o ser humano. A pesquisa, liderada pelo professor Mark Tuszynski e realizada na Universidade da Califórnia, conseguiu resultados muito promissores, mas não antes de falhar ao tentar usar as mesmas técnicas utilizadas com os roedores. Algumas coisas precisaram ser mudadas para que as células-tronco sobrevivessem e exercessem seu efeito terapêutico, como métodos do procedimento cirúrgico e grau maior de imunossupressão. Se ensaios clínicos fossem feitos com seres humanos sem esse conhecimento, é possível que eles fossem considerados ineficientes não devido à impossibilidade de esse tipo de célula ter um efeito clínico significativo mas, sim, devido ao uso de um protocolo de tratamento equivocado.
Por causa dessa necessidade de adaptação metodológica, os enxertos de células-tronco nos primeiros 4 macacos tratados não sobreviveram. Mas, após as mudanças, o tratamento em mais 5 deles pode ser considerado um sucesso. Cada um teve 20 milhões de células-tronco neurais humanas depositadas diretamente no local da lesão e, ao longo dos nove meses que se seguiram, elas se integraram à medula espinhal. Os pesquisadores chegaram a observar 150000 axônios humanos formados, chegando a distâncias de até 50mm – e eles foram capazes de estabelecer sinapses com neurônios do circuito espinhal não danificado. O contrário também aconteceu: axônios dos neurônios dos animais conseguiram se conectar com as células transplantadas.
Ainda mais promissor é o fato de que esses resultados foram acompanhados de efeitos clínicos significativos. Os macacos em que as células-tronco transplantadas sobreviveram tiveram resultados melhores na função dos membros em comparação com aqueles em que elas não sobreviveram – com melhoras observadas até 10 semanas após a lesão. Após nove meses, esses animais conseguiam segurar objetos exibindo um controle mais fino dos movimentos. Esse período de tempo não é suficiente para avaliar todo o potencial terapêutico desse procedimento. Como o mesmo autor publicou recentemente e nós destacamos aqui, células-tronco transplantadas em casos de lesão espinhal têm efeitos prolongados – no caso do estudo, chegou a 18 meses.
Referência:
Rosenzweig ES et al. Restorative effects of human neural stem cell grafts on the primate spinal cord. Nature Medicine. 2018.