Recém-nascido é tratado com transplante de células do fígado derivadas de células-tronco embrionárias em estudo clínico realizado no Japão

Recém-nascido é tratado com transplante de células do fígado derivadas de células-tronco embrionárias em estudo clínico realizado no Japão

Médicos de uma instituição de saúde em Tóquio, no Japão, realizaram um estudo clínico inédito no qual utilizaram células-tronco para tratar um recém-nascido com doença hepática. A equipe obteve hepatócitos, células do fígado, a partir de células-tronco embrionárias e as transplantou em um bebê de 6 dias portador de uma disfunção no fígado que leva ao acúmulo de substâncias tóxicas no organismo e pode ter sequelas graves. O procedimento garantiu a sobrevivência do bebê até que ele fosse capaz de receber um transplante do fígado doado por seu pai.

 

Vimos anteriormente aqui no blog que, já há algum tempo, os cientistas são capazes de diferenciar células-tronco em células do fígado em laboratório e, com isso, avançar no sentido de desenvolver tratamentos regenerativos para esse órgão.

Resultados publicados recentemente de um estudo clínico inédito realizado no Japão confirmam o grande potencial das células-tronco para o tratamento de doenças hepáticas. Médicos do Centro Nacional Japonês de Saúde e Desenvolvimento Infantil (National Center for Child Health and Development, NCCHD) anunciaram a realização de um transplante bem-sucedido de hepatócitos derivados de células-tronco embrionárias humanas em um paciente de 6 dias que apresentava uma doença congênita do fígado, causada por uma disfunção no ciclo da ureia.

O ciclo de ureia é controlado por uma série de enzimas e é responsável por converter amônia a ureia, para sua remoção através da urina. Nas doenças do ciclo de ureia, uma das seis enzimas do ciclo não funciona corretamente, levando a um acúmulo da amônia, que é altamente neurotóxica, no organismo. Essa condição, conhecida como hiperamonemia, causa danos irreversíveis e pode levar à morte. O transplante hepático tem sido cada vez mais usado no tratamento das doenças do ciclo da ureia quando os tratamentos convencionais, como controle da dieta, se revelam difíceis.

No caso de recém nascidos, no entanto, os transplantes de fígado não são apenas tecnicamente difíceis, mas também costumam levar a complicações graves, como insuficiência respiratória e fluxo sanguíneo prejudicado devido à pressão abdominal, porque o fígado transplantado é muito grande em relação ao volume abdominal do paciente. Portanto, os transplantes de hepáticos nesses casos geralmente são realizados após o paciente atingir um peso seguro de 6 kg, o que geralmente ocorre de 3 a 5 meses após o nascimento. 

Na Europa e na América do Norte, os médicos são capazes, para tratar recém-nascidos, de usar hepatócitos isolados e criopreservados a partir de fígados removidos de doadores com morte encefálica. Assim, pode-se manter o fígado funcionando até que um transplante de órgão possa ser realizado. No Japão, a equipe do NCCHD já havia transplantado células hepáticas de doadores vivos para recém-nascidos com a doença logo após o nascimento, mas teve dificuldade em garantir a fixação e viabilidade das células hepáticas. Por esse motivo, o centro japonês concentrou-se nos hepatócitos derivados de células-tronco pluripotentes (células-tronco embrionárias humanas), que podem ser proliferadas quase indefinidamente como uma nova fonte celular. Ao armazenar as células-tronco embrionárias humanas em um estado no qual elas são induzidas a se diferenciarem em hepatócitos e criopreservadas, elas também podem ser usadas para transplantes de emergência.

Durante um período de dois dias em outubro de 2019, os médicos injetaram cerca de 190 milhões de células hepáticas nos vasos sanguíneos do fígado (com um acesso feito pelo cordão umbilical) de um recém-nascido de 6 dias com hiperamonemia. Depois do transplante, constatou-se que a concentração de amônia no sangue do bebê parou de aumentar e após algumas semanas ele recebeu alta do hospital. O recém-nascido seguiu sendo acompanhado pelos médicos até que 5 meses depois, já com 7 kg, recebeu um transplante de fígado de um doador vivo – seu próprio pai. Dois meses após o transplante, o bebê, com 6 meses de idade, deixou o hospital sem apresentar quaisquer sequelas neurológicas.

Em um comunicado à imprensa, a equipe do NCCHD declarou: “O sucesso deste estudo demonstra segurança no primeiro estudo clínico do mundo usando células-tronco embrionárias humanas para pacientes com doença hepática. Espera-se que este ensaio clínico seja usado como um caso modelo, levando ao desenvolvimento de produtos de medicina regenerativa relacionados a doenças no fígado”.

 

Referências

Agência Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento de Japão – Comunicado para a imprensa (21/05/2020): https://www.ncchd.go.jp/en/news/2020/20200521-e.pdf

The Mainichi – 1st transplant using liver cells from embryonic stem cells conducted on baby in Japan (21/05/2020): https://mainichi.jp/english/articles/20200521/p2a/00m/0na/019000c

EIMD – Doenças do ciclo da ureia – Guia para doentes, pais e famílias: https://www.e-imd.org/files/medias/files/patient/parents-family/cycle_uree_PORT.pdf


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