Empresas garantem que a fonte de juventude se encontra nas gordurinhas dos pacientes. Mas existe embasamento científico para o uso de células-tronco em procedimentos estéticos?
O tecido adiposo é reconhecidamente uma fonte de células-tronco, mas ainda há muito a ser estudado sobre as características dessas células, suas potenciais aplicações e riscos. Isso não impede, no entanto, diversas clínicas no Brasil e no mundo de promoverem “terapias com células-tronco” em procedimentos estéticos, como preenchimento e rejuvenescimento da pele.
A promessa é usar a gordura removida do paciente, durante uma lipoaspiração por exemplo, como fonte de células-tronco. O procedimento costuma envolver a obtenção de tecido adiposo seguido de “processamento” desse tecido. A etapa de “processamento” nem sempre é bem definida ou explicada em detalhes para o paciente. Após ser “processado”, o tecido pode ser injetado de volta no paciente, ou usado como matéria-prima para produção de cremes e outros cosméticos. As células-tronco presentes no tecido ou cosmético seriam capazes de rejuvenescer o aspecto da pele.
Em que ponto estamos
É verdade que células-tronco estão sendo testadas em procedimentos estéticos, e é verdade que o tecido adiposo contém células-tronco. É possível que essas células, ou fatores produzidos por elas, de fato ajudem a melhorar a aparência da pele.
No entanto, esses tratamentos ainda estão na fase de testes. Existem ensaios clínicos em andamento que testam a segurança e eficácia desses procedimentos de modo rigoroso e controlado. No momento, não existe evidência científica suficiente de que a injeção de células-tronco, ou de fatores produzidos por elas, de fato funcionem em procedimentos estéticos, ou de que são seguros a longo prazo. Em 2010, o Conselho Federal de Medicina (CFM) emitiu um comunicado recomendando cautela e reiterando que o uso de células-tronco em aplicações cosméticas ainda está em fase experimental. Em 2011, duas sociedades americanas de cirurgia plástica, a American Society for Aesthetic Plastic Surgery (ASAPS) e a American Society of Plastic Surgeons (ASPS), publicaram um comunicado parecido. Seis anos depois, as conclusões desses órgãos ainda são válidas: embora pareça promissor, o uso de células-tronco em aplicações estéticas e cosméticas ainda está em fase de pesquisa.
Fique atento
● Frequentemente, o “processamento” envolve procedimentos padrões associados à lipoenxertia – isso é, aplicação de enxertos de gordura na face ou corpo para preenchimento. Embora algumas clínicas usem nomes chamativos como “rejuvenescimento com células-tronco”, o procedimento nada mais é do que o tradicional preenchimento com gordura. Apelar para as células-tronco que estão naturalmente presentes no tecido adiposo como estratégia de marketing é visto como antiético por muitos cirurgiões plásticos.
● Em muitos casos, os procedimentos não precisam ser aprovados por agências regulatórias. No Brasil, não são todos os tratamentos cosméticos que precisam ser aprovados pela ANVISA. Nos EUA, a lei permite o uso de células do próprio paciente desde que elas sejam injetadas sem modificação ou com “processamento mínimo” (o que constitui “processamento mínimo” não é claramente definido). Por essa razão, muitos tratamentos supostamente envolvendo células-tronco não são ilegais – mas isso não significa que não têm riscos ou que funcionam. Nos EUA, uma pesquisa com cirurgiões plásticos indicou que a classe preferiria que a Food and Drug Administration (FDA) tivesse mais poderes para monitorar aplicações estéticas de células-tronco.
● Tratamentos utilizando plasma rico em fibrina (PRF), plasma rico em plaquetas (PRP) e células-tronco vegetais também estão em fase de pesquisa e necessitam de mais evidências que demonstrem que são eficazes e seguros.
Referências
Joint ASPS & ASAPS Position Statement: Stem Cells and Fat Grafting. May, 2011
James et al. Fat, Stem Cells, and Platelet-Rich Plasma. Clinics in Plastic Surgery, 2016-07-01,
Volume 43, Issue 3, Pages 473-488
Nayar et al. The Ethics of Stem Cell–Based Aesthetic Surgery: Attitudes and Perceptions of the
Plastic Surgery Community. Aesthet Surg J (2014) 34 (6): 926-931.
McArdle et al. The Role of Stem Cells in Aesthetic Surgery: Fact or Fiction? Plastic &
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