Cientistas da Universidade de Tóquio e da Universidade Stanford conseguiram cultivar um grande número de células-tronco hematopoiéticas em laboratório por meio do aprimoramento das condições de cultura destas células. Esta expansão ex vivo, de forma estável, ainda não havia sido atingida por outros pesquisadores. A descoberta tem implicações importantes tanto para a pesquisa básica de células-tronco hematopoiéticas quanto para o tratamento de doenças relacionadas ao sangue.
O transplante de células-tronco hematopoiéticas (CTH) é uma modalidade terapêutica amplamente utilizada no tratamento de doenças do sangue, sejam elas benignas ou malignas, hereditárias ou adquiridas ao longo da vida. Esse tipo de transplante consiste em fornecer ao paciente células progenitoras que, em geral, são provenientes da medula óssea de um doador. Estas células migram para a medula óssea do paciente, iniciando sua reconstituição hematopoiética, ou seja, o processo de fabricação de células sanguíneas normais.
Os cientistas têm buscado, por muito tempo, maneiras de expandir as CTH em laboratório para que atinjam um número satisfatório e efetivo para transplante. Embora tenham sido capazes de isolar as CTH com alta pureza por mais de 20 anos, sua expansão ex vivo, de maneira estável, ainda não havia sido atingida até recentemente. Cientistas da Universidade de Tóquio e da Universidade Stanford, na Califórnia, publicaram há algumas semanas importantes avanços neste assunto. Os pesquisadores conseguiram cultivar um grande número de células-tronco formadoras de sangue em laboratório por meio do aprimoramento das condições de cultura destas células.
Os cientistas descobriram que a razão pela qual o cultivo das células não era eficiente era a presença de proteínas do sangue humano denominadas albuminas. Essas proteínas, principalmente liberadas pelas células imunes, impediam que as células crescessem. Eles então avaliaram diversas alternativas e concluíram que um composto sintético chamado álcool polivinílico (PVA), frequentemente encontrado na composição de colas, poderia ser um substituto funcionalmente superior à albumina. O PVA se mostrou muito interessante por ser considerado não tóxico pelas agências reguladoras e compatível com as boas práticas de fabricação.
Inicialmente, no estudo, CTH de camundongos foram expandidas em quase 900 vezes sua quantidade inicial em apenas um mês. Então, as células foram transplantadas de volta em diferentes camundongos, onde puderam se desenvolver e gerar diversos componentes do sangue.
Normalmente, o sistema imunológico do animal tenta destruir as células de um doador com o qual não possui uma combinação genética. É por esse motivo que o sistema imunológico precisa ser eliminado ou suprimido antes desse tipo de transplante. O grupo de cientistas, no entanto, injetou as células em camundongos com sistema imune intacto. O líder da pesquisa, Hiromitsu Nakauchi, afirmou que provavelmente o bom resultado obtido deve-se ao grande número de células utilizado no transplante. Agora, o grupo de Nakauchi está trabalhando na adaptação da técnica para o crescimento de CTH humanas.
A descoberta tem implicações importantes tanto para a pesquisa básica de CTH quanto para a hematologia clínica. Usualmente, a fim de evitar a rejeição às células doadas, assim como mencionado para o animal, um paciente deve passar por um processo denominado condicionamento, no qual ocorre a destruição ou supressão de seu sistema imune por meio de doses de quimioterapia, às vezes associadas à radioterapia, antes que ele receba as células progenitoras. No entanto, o condicionamento aumenta o risco de as CTH doadoras atacarem os tecidos do paciente, levando a doenças potencialmente fatais. Se a abordagem de Nakauchi e seu grupo funcionar em células humanas, o condicionamento não deverá mais ser necessário.
Além disso, este avanço abre portas para que seja a retomada a atenção para outras fontes de CTH, divulgadas em 2017 por George Daley e colaboradores, da Faculdade de Medicina de Harvard, em Boston. Daley reprogramou células da pele humana em células-tronco pluripotentes induzidas (iPSC), que depois se desenvolveram em células muito próximas das células-tronco do sangue. A vantagem de usar as iPSC para fazer CTH ao invés de obtê-las por meio de transplante de medula óssea de um doador, é que as iPSC são geradas a partir de células do próprio paciente, eliminando a necessidade de um doador geneticamente compatível. O grupo de Daley vinha tendo dificuldades em cultivar um grande número de CTH em seu laboratório e, agora, o método desenvolvido pelo grupo de Nakauchi poderá mudar isso.
Referências
Notícia – “Blood stem cells produced in vast quantities in the lab”
Hematologia – Albert Einstein (Sociedade Beneficente Israelita Brasileira)