Pesquisadores da University of New South Wales, na Austrália, desenvolveram uma tecnologia que transforma células de gordura em um novo tipo celular: a célula-tronco multipotente induzida. Essas células versáteis possuem a capacidade de regenerar lesões em diferentes tipos de tecidos. Mas, apesar de o potencial terapêutico dessas células ser promissor, muitos estudos ainda precisam ser realizados com objetivo de avaliar a segurança de sua aplicação no ser humano
Já imaginou se fosse possível extrair um pouco de gordura do seu corpo, modificá-la no laboratório e com isso produzir células capazes de regenerar lesões no seu organismo? Parece muito um roteiro de algum filme de ficção científica, não? Pois saiba que pesquisadores da University of New South Wales (UNSW), na Austrália, estão cada vez mais perto de tornar essa ideia uma realidade.
Atualmente, grande parte das pesquisas que visam estudar o potencial terapêutico das células-tronco está focada nas células-tronco mesenquimais (CTMs), pois elas podem ser facilmente obtidas a partir de tecidos adultos, podem ser multiplicadas em laboratório, são capazes de gerar diferentes tipos de tecidos e não causam tumores quando transplantadas. Mas, alguns pesquisadores estão apostando em abordagens alternativas.
Um grupo de cientistas liderado pelo professor John Pimanda publicou, em abril de 2016, no periódico Proceedings of the National Academy of Sciences (PNAS), um trabalho descrevendo o desenvolvimento de uma célula denominada célula-tronco multipotente induzida (iMS). Essa célula consiste basicamente em um tipo de célula-tronco capaz de se adaptar ao ambiente da lesão e reparar diferentes tecidos danificados. Essas células são produzidas por meio da exposição de células humanas de gordura a duas substâncias: a 5-azacitidina (AZA), um medicamento usado para terapia contra câncer de sangue, e o fator de crescimento derivado de plaquetas (PDGF-AB) – um fator de crescimento de ocorrência natural que estimula o crescimento celular e a reparação de tecidos. O tratamento com esses compostos faz com que os adipócitos percam sua identidade e se transformem em iMS em cerca de duas a três semanas.
O próximo passo do desenvolvimento dessa tecnologia, que faz com ela esteja cada vez mais próxima de ser aplicada em humanos, foi descrito no artigo publicado, em janeiro deste ano, na Science Advances. Os experimentos consistiram no transplante das iMS humanas em camundongos. Essas células mantiveram-se dormentes e, somente quando os animais sofreram alguma lesão, elas transformaram-se no tecido que precisava ser curado, independentemente se esse tecido era músculo, osso, cartilagem ou um vaso sanguíneo. As células basicamente seguiram as pistas moleculares do local da lesão e se misturaram ao tecido que precisava de reparo, sem gerar nenhum tipo de célula indesejada, demonstrando o incrível potencial terapêutico das iMS.
A aplicação clínica potencial dessa tecnologia poderá seguir dois caminhos: o primeiro é a aplicação direta das iMS em alguma lesão no paciente, já o segundo é a possibilidade de combinar a AZA e a PDGF-AB em uma minibomba instalada no corpo, como se fosse um marcapasso. Essa minibomba poderia ser colocada perto de alguma lesão a ser tratada e passaria a liberar doses reguladas dos compostos para produzir novas iMS.
Embora os resultados sejam animadores, muitas avaliações ainda precisam ser realizadas, especialmente para garantir a segurança do tratamento. Se os estudos futuros forem bem sucedidos, os pesquisadores acreditam que esse tipo de terapia pode passar a ser aplicada no mundo real em cerca de 15 anos.
Referências
UNSW Newsroom – Medical scientists develop ‘game changing’ stem cell repair system (04/04/2016): https://newsroom.unsw.edu.au/news/health/medical-scientists-develop-%E2%80%98game-changing%E2%80%99-stem-cell-repair-system
https://advances.sciencemag.org/content/7/3/eabd1929/tab-pdf
EurekAlert – Scientists are a step closer to developing ‘smart’ stem cells – made from human fat (13/01/2021): https://www.eurekalert.org/pub_releases/2021-01/uons-saa011321.php
Neoscope – Scientists reprogram fat cells to repair injuries (14/01/2021): https://futurism.com/neoscope/scientists-reprogram-fat-cells