Medicamentos órfãos são produtos médicos destinados ao tratamento de doenças raras e geralmente são fruto do uso de tecnologias avançadas, como engenharia genética e engenharia de tecidos. Cada vez mais produtos dessa categoria vêm sendo aprovados por agências reguladoras em todo o mundo, mas a implementação de estímulos regulatórios e econômicos ainda são necessários para ampliar o acesso dos pacientes que precisam a estes medicamentos.
Os medicamentos órfãos são produtos médicos destinados à prevenção, diagnóstico ou tratamento de doenças muito graves ou que constituem um risco para a vida e que são raras. Estes medicamentos são denominados “órfãos” porque, em condições normais de mercado, a indústria farmacêutica tem pouco interesse em desenvolver e comercializar medicamentos destinados apenas a um pequeno número de doentes. Para as companhias farmacêuticas, o custo extremamente elevado que representa todo o processo até à introdução no mercado de um medicamento não seria recuperado pelas vendas previstas do medicamento. Geralmente, os medicamentos órfãos são altamente inovadores, sendo produtos de biotecnologia e outras tecnologias avançadas, como engenharia genética e engenharia de tecidos (saiba mais aqui).
As doenças raras afetam cerca de 6% a 8% da população mundial e geralmente são crônicas, progressivas e degenerativas, colocando em risco a vida do paciente. No Brasil, é considerada doença rara aquela que afeta até 65 pessoas em cada 100.000 indivíduos. Estima-se que existam entre 6 mil e 8 mil tipos de doenças que se enquadram nessa categoria e a maior parte delas, cerca de 80%, é de origem genética. Os portadores dessas doenças enfrentam diversas dificuldades, dentre elas, o acesso limitado a medicamentos e tratamentos. Muitas vezes, os pacientes precisam entrar na justiça para obter medicamentos pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
Tendo isso em vista, a Resolução RDC nº 205/2017 da ANVISA, Agência Nacional de Vigilância Sanitária, que entrou em vigor em fevereiro de 2018, estabeleceu procedimentos especiais para aprovação de ensaios clínicos, certificação de boas práticas de fabricação e registro de novos medicamentos para o tratamento, diagnóstico ou prevenção de doenças raras, com o objetivo de desburocratizar e agilizar tais procedimentos. Além disso, no ano passado, em um julgamento para decidir questões importantes sobre o acesso a tratamentos médicos por judicialização, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) considerou os medicamentos raros uma exceção à regra de que “o Estado não pode ser obrigado a fornecer medicamento experimental sem registro na ANVISA”. Assim, o STF determinou que, mesmo que uma determinada indústria farmacêutica não tenha solicitado o registro de um medicamento no Brasil, se o medicamento já tiver sido registrado em renomadas agências de regulação no exterior e não existir substituto terapêutico com registro nacional, a importação do medicamento pode ser solicitada, excepcionalmente (para saber mais, leia esta matéria).
Nos Estados Unidos e na Europa, o processo regulatório relativo à designação de medicamentos órfãos é realizado pela FDA (Food and Drug Administration) e EMA (European Medicine Agency), respectivamente. Um estudo realizado na Fundação Oswaldo Cruz (FIOCRUZ) revelou que os procedimentos para solicitação de designação de medicamento órfão adotados pela FDA e EMA são bastante similares entre si, mas que as normas brasileiras, por sua vez, não estão ainda totalmente harmonizadas. Incentivos regulatórios e econômicos que favorecem a pesquisa e o desenvolvimento de medicamentos órfãos são realidade nos EUA e Europa e devem ser efetivamente implementados no Brasil, a fim de encorajar os laboratórios e indústrias farmacêuticas a desenvolver e comercializar medicamentos para o tratamento de doenças raras.
A boa notícia é que cada vez mais medicamentos órfãos têm sido aprovados, comprovando-se que estes têm obtido reconhecimento de sua importância e destaque no mercado nacional e internacional. Devido ao seu elevado potencial terapêutico, células-tronco têm sido muito usadas para o desenvolver deste tipo de produto. No próximo post, falaremos sobre um produto à base de células-tronco geneticamente modificadas recentemente designado pela EMA como medicamento órfão.
Referências
Eurordis (Rare Diseases Europe): https://www.eurordis.org/pt-pt/medicamentos-orfaos
ANVISA – Doenças raras ganham regra específica para medicamento (28/02/2018): http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/doencas-raras-ganham-regra-especifica-para-medicamento/219201?p_p_auth=YHWAkSox&inheritRedirect=false
Veja (Blog Letra de Médico) – Equidade: STF reconhece existência e peculiaridades de doenças raras (27/05/2019): https://veja.abril.com.br/blog/letra-de-medico/equidade-stf-reconhece-existencia-e-peculiaridades-de-doencas-raras/
Dissertação desenvolvida na FIOCRUZ – Análise comparativa de aspectos regulatórios para registro de medicamentos órfãos nas agências ANVISA, FDA e EMA (2019): https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/34907