É a primeira vez que mini-cérebros com mielina são criados usando células-tronco, um avanço importante para as pesquisas na busca de novos tratamentos para doenças neurológicas
Essas pequenas estruturas esferoides conhecidas como mini-cérebros têm sido intensamente estudadas nos últimos anos como possível modelo para entender doenças neurológicas e buscar novos tratamentos. Com essa tecnologia, já foi possível formar vários tipos de neurônios e criar estruturas relativamente complexas e funcionais que imitam redes cerebrais. Além disso, elas chegaram até a ser implantadas no cérebro de camundongos, o que permite que se desenvolvam mais do que quando cultivadas apenas in vitro.No entanto, até pouco tempo estava faltando nesses organoides um componente fundamental para o funcionamento do cérebro: a mielina.
Não é mais o caso. Pela primeira vez, em estudo relatado na revista Nature Methods, pesquisadores conseguiram criar mini-cérebros com mielina a partir de células-tronco pluripotentes induzidas e células-tronco embrionárias. A mielina é produzida por um tipo de célula da glia chamado oligodendrócito, e problemas nessas células causam sintomas graves que afetam aspectos sensoriais, motores e cognitivos como, por exemplo, os observados em pacientes com esclerose múltipla.
Nesse trabalho, os oligodendrócitos estavam presentes nos organoides desenvolvidos pela equipe após 20 semanas e, em 30 semanas, a mielina estava presente de forma mais madura, mas não chegou a formar os nódulos de Ranvier, que otimizam a função de sinalização celular nos neurônios adultos. Esse tempo de maturação está de acordo com o que se sabe até o momento sobre a cronologia do desenvolvimento neural, o que sugere que o mecanismo envolvido é regulado por uma espécie de relógio celular interno.
Agora, os cientistas podem usar organoides formados com oligodendrócitos para estudar a formação normal da mielina e alterações patológicas. De fato, o grupo já testou medicamentos aprovados pela agência regulatória americana que melhoram a formação de mielina, comprovando que essa técnica pode ser usada para descobrir novos medicamentos. Além disso, eles estudaram a doença de Pelizaeus-Merzbacher, de origem genética e que se caracteriza pela falta de mielina no sistema nervoso. Foi possível recapitular os mecanismos da doença e as mutações envolvidas, e corrigi-las usando CRISPR levando à obtenção de mielina após 20 semanas de cultivo dos organoides “corrigidos”.
E qual é o segredo para criar os mini-cérebros formando estruturas complexas com oligodendrócitos e mielina? Parece simples depois de revelado: basta expor as células aos fatores de crescimento PDGF, IGF-1 e T3. Mas, na verdade, o feito é resultado de muitos anos de trabalho de vários pesquisadores desse e de outros grupos. Só esse grupo tem colaborações desde 2011 estudando doenças como esclerose múltipla.
Referências:
Mayur Madhavan et al, Induction of myelinating oligodendrocytes in human cortical spheroids,
Nature Methods.2018. DOI: 10.1038/s41592-018-0081-4
MedicalXpress – New method adds missing functionality to brain organoids