Organoides podem auxiliar na recuperação de lesões na pele e até mesmo no tratamento da calvície

Organoides podem auxiliar na recuperação de lesões na pele e até mesmo no tratamento da calvície

Pela primeira vez, pesquisadores conseguiram desenvolver, em laboratório, pele sintética humana que contém cabelo. Essas estruturas, os organoides de pele, são extremamente promissoras para o estudo do desenvolvimento da pele humana e para o tratamento de doenças de pele, de lesões como queimaduras e, até mesmo, da calvície

 

A pele, maior órgão do corpo humano, além de ser responsável pelo revestimento do organismo, realiza proteção contra microrganismos, impactos, desidratação e promove regulação térmica. Dessa maneira, qualquer tipo de lesão ou doença que afete este órgão pode levar a consequências muito complicadas. 

Como visto em um texto anterior do blog, os cientistas têm conseguido cultivar pele sintética em laboratório e até mesmo enxertá-la em pacientes, como uma estratégia de regeneração da pele lesionada. Contudo, até o momento, essa pele sintética não apresentava um importante componente: cabelo. Mas, um estudo que acaba de ser publicado na revista Nature está mudando esse quadro: pesquisadores americanos desenvolveram uma maneira de cultivar, em laboratório, pele humana com cabelos a partir de células-tronco pluripotentes. Basicamente, o processo consiste em fornecer, para essas células, diferentes tipos de substâncias como fatores de crescimento ou proteínas. Essas substâncias possuem capacidade de transformar as células-tronco em diferentes tipos de tecidos presentes na pele, como a derme e a epiderme, incluindo a presença de folículos capilares. As células-tronco vão desenvolvendo-se e amadurecendo no laboratório de forma muito semelhante ao que acontece no organismo real, e é aí que mora o segredo: essa interação entre a epiderme e a derme é o que proporciona o surgimento do cabelo na pele sintética. Esse agregado celular, que contém epiderme estratificada, derme rica em gordura e folículos capilares pigmentados equipados com glândulas sebáceas, chama-se organoide e demora cerca de 5 meses para ser completamente formado. Um fato curioso é que essa pele desenvolve-se de dentro para fora, ou seja, quando os folículos capilares são formados, a raiz cresce para fora e o cabelo cresce para o interior do agregado celular.

Para descobrir se esses organoides de pele podem realmente contribuir para a medicina regenerativa e promover recuperação da pele lesionada, os pesquisadores fizeram transplantes dessas estruturas em feridas presentes em modelos animais (camundongos). Após cerca de um mês, 50% dos agregados celulares abriram-se, floresceram e se integraram à pele do camundongo, produzindo uma estrutura que se assemelha muito à pele humana adulta, com presença de folículos capilares em crescimento (Figura 1).

Figura 1. Organoide de pele transplantado (Adaptado de Nature, 2020)

Entretanto, se pensarmos em uma aplicação clínica, o tempo necessário para a realização do processo inteiro é bastante longo, pois envolve o tempo de produção das células-tronco do paciente, desenvolvimento dos organoides de pele e integração do enxerto na pele do paciente – alguém com queimaduras, por exemplo, não pode esperar tanto tempo para a recuperação de sua pele. Por isso, os pesquisadores estão estudando formas de reduzir o tempo de desenvolvimento dos organoides e também a possibilidade de implantá-los em um estágio mais precoce do desenvolvimento. 

Uma outra característica desses organoides que ainda precisa ser aprimorada é o fato de que o cabelo produzido é curto e assemelha-se a cabelo de bebê. Assim, é necessária uma forma de “amadurecer” esse cabelo, principalmente se levarmos em consideração o ponto de vista estético.

Esse mesmo grupo de pesquisadores já tinha produzido organoides de pele com folículos capilares, porém, usaram células de camundongos (leia aqui). Outras estratégias com o uso de células-tronco pluripotentes para geração de folículos capilares em camundongos também já haviam sido exploradas (veja aqui). No entanto, a geração de organoides de pele com folículos capilares a partir de células-tronco humanas é inédita e extremamente importante pois, além de possibilitar a diminuição do uso de modelos animais, proporciona uma forma mais fidedigna de investigação acerca das condições que afetam a pele humana. Essa conquista é muito promissora para estudos futuros de desenvolvimento da pele humana, modelagem de doenças de pele, terapias envolvendo medicina regenerativa e até mesmo tratamento para a calvície.

Referências

Lee, J. et al. Hair-bearing human skin generated entirely from pluripotent stem cells. Nature 582, 399–404 (2020)

Nature – Regenerative medicine could pave the way to treating baldness (03/06/2020): https://www.nature.com/articles/d41586-020-01568-2#ref-CR2


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