A pesquisa com células-tronco embrionárias divide opiniões – se, por um lado, alguns a defendem pensando nos benefícios que pode trazer para a ciência e para a população, por outro, alguns questionam a moralidade desse tipo de pesquisa pelo fato de essas células serem obtidas a partir da destruição de embriões humanos.
O debate em torno da pesquisa com células-tronco embrionárias envolve um dilema ético que se origina na impossibilidade de atender simultaneamente a dois princípios morais: o dever de prevenir ou aliviar o sofrimento (no caso, por meio dos possíveis impactos de descobertas científicas na medicina) e o dever de respeitar o valor da vida humana (uma vez que os embriões teriam o potencial de se tornar seres humanos).
Para se posicionar nessa discussão, é importante entender a origem dessas células e pensar sobre o status do embrião na fase do desenvolvimento em que elas são obtidas. As células-tronco embrionárias são obtidas de embriões em um estágio em que são chamados de blastocistos, quando têm em torno de 5 dias e em torno de 100 células e são mais ou menos do tamanho de um grão de areia. Elas são retiradas, mais especificamente, de uma região chamada massa celular interna do blastocisto. São células não diferenciadas, pluripotentes, ou seja, que podem dar origem a todos os tipos de células especializadas do corpo.
Normalmente, três coisas podem acontecer com embriões a partir desse momento: eles podem não se mostrar viáveis e ser perdidos em abortos espontâneos, eles podem dar origem a uma pessoa, ou eles podem dar origem a mais de uma pessoa (caso em que há gestação de gêmeos). Mais importante do que isso, apenas por volta dos 16 dias de idade as células do embrião se diferenciaram e coordenaram de maneira significativa – existe um consenso na comunidade científica de que pesquisas podem ser realizadas com embriões até 14 dias após a fertilização. Além disso, os embriões de que são obtidas as células-tronco são formados em clínicas de fertilização in vitro e só poderiam gerar um organismo se fossem implantados no útero. Esses fatos são, por vezes, usados como argumentos a favor da pesquisa com células-tronco embrionárias.
Outros argumentos mais fortes têm relação com os benefícios que as pesquisas com essas células poderiam trazer à população, que se relacionam com dois tipos principais de vertentes: o entendimento do processo de diferenciação celular e do desenvolvimento do organismo humano e o uso de células-tronco embrionárias para gerar células especializadas que poderiam ser utilizadas em tratamentos, aliviando o sofrimento de muitos pacientes.
Algumas pessoas, no entanto, defendem que a vida humana começa após a fertilização, com a formação do zigoto, que já teria toda a informação genética necessária para dar origem a uma pessoa. Essa visão está associada à defesa de que o status do embrião é o de um ser humano e que a sua vida deve ser protegida e respeitada de acordo. De acordo com esse posicionamento, a pesquisa com células-tronco embrionárias é inaceitável, pois envolve a destruição de embriões. Esse ponto de vista está associado a algumas religiões, como religiões cristãs (outras, como o judaísmo e islamismo, não associam a fertilização ao início da vida humana e permitem pesquisas com embriões).
Mesmo aceitando essa premissa, é possível defender que pesquisas sejam realizadas com células obtidas a partir de embriões que seriam descartados após tratamentos de fertilização in vitro, argumentando que, assim, pelo menos a destruição desses embriões poderia trazer algum benefício à população.
Mas a maior parte dos especialistas considera o status moral dos embriões algo intermediário entre o de simples material biológico e o de uma pessoa, defendendo que pesquisas podem ser realizadas com certos cuidados éticos.
Algumas alternativas permitem contornar as polêmicas relacionadas à pesquisa com células-tronco embrionárias, como o uso das células-tronco pluripotentes induzidas, que são células adultas, como células da pele, reprogramadas para um estado não diferenciado que se tornam pluripotentes, ou o uso das células-tronco adultas, que são multipotentes, podendo dar origem a alguns outros tipos de células especializadas. Células-tronco adultas podem ser encontradas no sangue, na medula óssea, no tecido adiposo e até na polpa do dente, e têm sido intensamente estudadas. Uma grande vantagem dessas outras fontes de células é que o seu uso não envolve os dilemas éticos discutidos até aqui. No entanto, mesmo com os avanços obtidos com essas outras células-tronco, muitos cientistas defendem que a pesquisa com células-tronco embrionárias ainda é necessária pois cada tipo celular tem características próprias e elas seriam o controle perfeito para estudar os processos de diferenciação celular.
Referências:
EuroStemCell – Embryonic stem cell research: an ethical dilema
Stanford Encyclopedia of Philosophy – Ethics of Stem Cell Research