Pesquisadores acreditam que células-tronco podem ser úteis para tratar autismo pois elas poderiam melhorar a neuroinflamação existente no cérebro desses indivíduos
Segundo estimativas americanas, os transtornos do espectro autista afetam um indivíduo em cada 68 da população, um número bastante preocupante. O autismo é caracterizado por problemas na capacidade sócio-comunicativa dos indivíduos, associados a comportamentos repetitivos e estereotipados. Muitas pessoas com autismo apresentam também hiperatividade, ansiedade, comportamentos agressivos (muitas vezes contra si mesmos), o que compromete muito a qualidade de vida do indivíduo e da família.
A intervenção terapêutica mais utilizada em casos de autismo é a terapia cognitivo-comportamental realizada por psicólogos e psiquiatras, que pode ser complementada com outras intervenções terapêuticas, como terapia ocupacional e fonoaudiologia. Os medicamentos que costumam ser utilizados nestes pacientes visam o alívio dos sintomas secundários, como a hiperatividade e a ansiedade, o que pode contribuir para melhora dos aspectos primários e definidores da doença ao melhorar a capacidade de atenção e diminuição dos índices de estresse do paciente. Mas não há nenhum medicamento que primariamente atue na melhora das habilidades verbais e sociais dos pacientes.
As causas do autismo ainda não são muito bem definidas, mas uma das hipóteses é que processos de neuroinflamação possam influenciar o desenvolvimento e funcionamento do sistema nervoso central, resultando no transtorno. Esta hipótese se baseia em pesquisas que detectaram, por exemplo, níveis elevados de mediadores inflamatórios no fluido da medula espinhal de autistas ou a regulação inadequada da produção desses mediadores em células de pacientes investigadas em laboratório.
Baseados nessa hipótese é que pesquisadores americanos da Universidade de Duke decidiram investigar os benefícios das células-tronco para tratar o autismo, uma vez que se acredita que as células-tronco tenham a propriedade de modular as respostas do sistema imunológico e, além disso estudos em pacientes com paralisia cerebral já haviam demonstrado que este tipo de intervenção é segura. Assim, os pesquisadores fizeram uma infusão de células-tronco do cordão umbilical na circulação sanguínea de 25 crianças com autismo que tinham tido estas células armazenadas no momento de seu nascimento.
Uma avaliação completa do comportamento da criança foi realizada imediatamente antes do tratamento e após 6 e 12 meses da infusão. As avaliações, que foram realizadas tanto com base no relato dos pais quanto na observação de clínicos especializados, apontou que as crianças tiveram melhoras nos comportamentos sociais e repetitivos, melhora do vocabulário e também do contato visual. Além disso, nenhum efeito adverso ao longo desses 12 meses foi observado.
Embora sejam animadores, os resultados desse estudo devem ser interpretados com muita cautela. Primeiramente porque crianças autistas podem apresentar naturalmente uma evolução positiva ao longo do tempo e, como é impossível saber se a melhora é efeito da terapia ou não do ponto de vista individual, uma amostra muito maior de pacientes é necessária para que se possa inferir esta resposta. Em segundo lugar, este estudo foi um estudo do tipo “aberto” (ou, em inglês, open-label ), o que significa que tanto os médicos quanto os pais sabiam que o paciente estava recebendo o tratamento.
O grande problema desse tipo de estudo é o efeito psicológico que pode interferir na avaliação e interpretação da evolução do paciente. Por isso, os estudos que utilizam uma condição placebo, ou seja, em que uma parte dos pacientes do estudo não recebe o tratamento que está sendo testado, são os mais indicados, especialmente no caso de uma doença em que a análise dos efeitos da terapia não se baseia em um marcador biológico, mas sim no relato e avaliação de pais e clínicos.
Referências:
Autologous Cord Blood Infusions Are Safe and Feasible in Young Children with Autism Spectrum Disorder: Results of a Single-Center Phase I Open-Label Trial.
Dawson G, Sun JM, Davlantis KS, Murias M, Franz L, Troy J, Simmons R, Sabatos-DeVito M, Durham R, Kurtzberg J.
Stem Cells Transl Med. 2017 Apr 5. doi: 10.1002/sctm.16-0474. [Epub ahead of print]